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Insegurança Jurídica decorrente da morosidade de julgamento em controle concentrado e a inversão da máxima de que o direito vem a reboque dos fatos.

Tradicionalmente utilizada no mundo jurídico, sobretudo, nas cadeiras introdutórias do curso de direito, a expressão de que “o direito vem a reboque dos fatos”, destaca a natureza adaptável e flexível do sistema jurídico, que deve estar em constante evolução para atender às necessidades e demandas de uma sociedade em constante mudança. Essa interação entre direito e sociedade é fundamental para a manutenção do estado democrático de direito e para garantir que as leis sejam eficazes e justas, delas desdobrando a segurança jurídica esperada.

Partindo desta tradicional máxima, ressaltando a existência de controvérsias doutrinárias, dentre as quais, destaco o a teoria científica, capitaneada pelo celebre jurista brasileiro, Pontes de Miranda 1, que atenta, com grande pertinência, para relevância da extração científica do direito através dos fatos, num jogo de lapidação e aprimoramento constante implicando a sua atualização (ISERHARD-1994), é de rigor contemporizar, sobretudo, a partir do advento do Código de Processo Civil ora em vigente, o fortalecimento da jurisprudência enquanto relevante vetor de interpretação e conformação da lei vigente, em relação aos fatos jurídicos, inclusive, aqueles desdobrados dos próprios pronunciamentos judiciais 2.

Necessário esclarecer que o conceito mais consentâneo de jurisprudência se atrela ao entendimento interpretativo legal consolidado por reiteração de decisões emanadas de cortes julgadoras, os tribunais, não se enquadrando em tal definição as decisões isoladas e mais ainda, o mero voto ou votos em julgamentos colegiados não concluídos.

Com efeito, buscando garantir a segurança jurídica das decisões, por meio da uniformização dos entendimentos, o sistema processual civil introduzido a partir de 2015, estabeleceu a obrigação dos órgãos judicantes da observância dos precedentes decisórios qualificados, enumerados no art. 927 do CPC, dentre eles, destaco as decisões do Supremo Tribunal Federal proferidas em controle concentrado de constitucionalidade.

Passo outro, enquanto a estruturação formal da vinculatividade dos precedentes qualificados traz ao sistema jurídico necessário incremento da segurança jurídica e fortalecimento da estabilidade do Poder Judiciário, reverberando nas relações jurídicas de modo geral, a indefinição de julgamentos em controle concentrado de constitucionalidade tem acarretado a inversão da ordem fática por direta influência do mecanismo judiciário, ensejando um verdadeiro fenômeno fático jurídico paradoxal.

No campo do direito tributário, este antinatural evento propaga reflexos fático jurídicos e econômicos, ainda maiores, considerando a costumeira dimensão nacional do objeto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs), as Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs), as Ações Diretas de Inconstitucionalidade por Omissão (ADOs) e as Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs), alcançando relações jurídicos tributárias em todos os entes federativos e ou sobre um contingente massivo de contribuintes.

À título de exemplo, cito o julgamento das ADIs 7066/7070/7078, onde se questiona a constitucionalidade do art. 3º da Lei Complementar Federal n.º 190/2022, que dispôs sobre a cobrança do ICMS- DIFAL, nas operações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto. Essas demandas foram, inclusive, objeto de artigo anteriormente publicado nesta Revista 3.

No caso, em que pese a relevância do tema e a dimensão econômica dos interesses envolvidos, o julgamento ainda não se encerrou, pendente o proferimento de três votos (Min. Barroso, Min. Luiz Fux e Min. Nunes Marques), estando o julgamento, indefinido, considerando que o Min. Alexandre de Moraes votou pela improcedência da ação direta, enquanto que os Ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes votaram pela improcedência, reconhecendo a constitucionalidade da cláusula de vigência prevista no art. 3º da LC nº 190/22, no que estabeleceu que essa lei complementar passou a produzir efeitos decorridos noventa dias da data de sua publicação e dos votos dos Ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, André Mendonça e Rosa Weber (Presidente), julgando procedente a ação, para aplicar interpretação conforme ao art. 3º da LC n.190/2022, que deve observar os princípios da anterioridade anual e nonagesimal.

Acrescento que em que pese própria da dinâmica do julgamento colegiado, a projeção do resultado do julgamento sofreu até então reviravolta, eis que os primeiro três votos, inclusive do relator, foram em sentido favorável ao reconhecimento da inconstitucionalidade do dispositivo que impôs a aplicação da regra limitadora do poder de cobrar o tributo em questão, sendo que, no presente momento, vê-se formada a maioria em favor da cobrança do imposto não após noventa dias da publicação da lei complementar, mas no exercício seguinte, o que no caso se dá a partir de janeiro de 2023.

Muito embora não se possa considerar como jurisprudência, muito menos qualificada, os votos em julgamento que ainda não se concluiu, o fato é que aos ansiosos olhares dos magistrados investidos da jurisdição tributária no âmbito das justiças estaduais, termina-se por ensejar efeito interno, de modo que se observa um ambiente jurídico de incertezas e de insegurança jurídica causada pela demora na conclusão do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal.

Ressalto que no sistema processual existem a ferramentas de suspensão individual do processo em tramitação no juízo ordinário, com a finalidade de aguardar o desfecho decisório de processo cujo efeito implicará repercussão direta no caso, prática que tem sido entendida como mais acertada 4, entretanto, a inexistência no caso das ADIs de decisão de suspensão nacional dos feitos, o que se deve mais pela singularidade da espécie da demanda e dos pedidos do que propriamente da necessidade e relevância do tema, termina por ensejar interno reflexo dissuasório, em que pese eivado de equívoco, junto à autoridade judicante, impelida, pois, a julgar a demanda, mesmo que este julgamento tenha que ser reconsiderado para que possa se ajustar ao julgamento superveniente em sede de controle concentrado.

Felizmente, confirmando a máxima de que “o direito vem a reboque dos fatos”, ao contribuinte foi conferida ferramenta de salvaguarda, apta a assegurar por si só a minoração das consequências da insegurança jurídica implementada pelo fenômeno da paralização dos julgamentos.

Por meio do depósito do montante integral do crédito tributário controvertido, previsto no inciso II, do art. 151 do Código Tributário Nacional, o contribuinte logra a obter, por força da lei e, no caso de judicialização, por atuação judicial vinculada, a suspensão da exigibilidade do crédito tributário discutido, o que implica, na prática, em evitar, em caso de julgamento desfavorável, o incremento dos custos da obrigação com encargos moratórios e multas, sendo, em caso de êxito, garantido de modo menos burocrático e moroso, o ressarcimento de valores que tenham sido reconhecidamente indevidos.


1 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Sistema de ciência positiva do Direito. 2. ed. Rio de Janeiro, Borsoi, 4 tomos, 1972.

2 ISERHARD, Antônio Maria Rodrigues in O CONCEITO DE DIREITO EM PONTES DE MIRANDA, acessado em:https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/106389/95950.pdf?sequence=1&isAllowed=y em 17/09/2023

3 COPA DO MUNDO FIFA2022 E O JULGAMENTO DAS ADIs 7066/7070/7078. SURPRESAS E REVIRAVOLTAS ATÉ O APITO FINAL. VENCEREMOS!? Publicada em dezembro de 2022.

4 ARE 1427892, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Julgamento: 26/04/2023, Publicação: 02.05.2023; RE n. 1.421.101, Relator o Ministro Dias Toffoli, DJe 2.3.2023; RE n. 1.420.523, Relator o Ministro Roberto Barroso, DJe 2.3.2023; RE n. 1.420.563, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe 2.3.2023; RE n. 1.419.766, Relator o Ministro Alexandre de Moraes, DJe 22.2.2023 e RE n. 1.418.721, Relator o Ministro Nunes Marques, DJe 8.3.2023

Sobre o Autor:

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Dr. Neilto Barreto Filho

Assessor de desembargador no TJBA, advogado licenciado, pós-graduado em Direito Tributário pelo IBET- Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, pós-graduando em Direito Digital, aplicadono Âmbito Judicial, pela ESMA-PB graduado em Direito pela UFBA.

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