Permitir Cookies

Este site usa cookies para garantir que você tenha a melhor experiência em nosso site.

Imagem

A Copa do Mundo FIFA 2022 e o julgamento das ADIS 7066/7070/7078

ICMS-DIFAL. Surpresas e reviravoltas até o apito final. Venceremos!?

Já quase esgotado o tempo regulamentar para o final do ano jurídico de 2022, sobretudo, com o avizinhar do recesso do Poder Judiciário, a partir do próximo dia 20 de dezembro, em meio a tantos fatos políticos e jurídicos relevantes e impactantes para o vindouro ano de 2023, o Brasil se vê envolto em dois eventos que de tão atípicos terminam por reluzir contornos de uma distópica relação de similitude. A Copa do Mundo FIFA de 2022 e a (in)definição do julgamento do ICMS DIFAL incidente sobre as operações de aquisição de mercadorias destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.

Se ao leitor parece algo aleatório à primeira vista, a estreita relação entre estes eventos será confirmada adiante. Veremos.

A Copa do mundo em novembro/dezembro, por si só, já guarda uma elevada carga de atipicidade, o que se avulta diante do local do evento, Catar, País cujas peculiaridades permeiam os sonhos de luxo e exuberância cosmopolita de muitos, que, contudo, na sua realidade próxima, impõe aos que lá se chegam, como se em forma de tributo, a obrigatória convivência com os reflexos da densa e ornamentada névoa da visão ultraconservadora e restritiva de direitos, fundamentada nos rígidos e enviesados parâmetros de moderação social e preceitos religiosos do Islã.

Mas afora as reportadas questões conjunturais, aos olhos do planeta, a Copa do Mundo está surpreendendo muitos com seus resultados, inclusive com os reflexos da tecnologia, seja na própria bola, bem como no auxílio dos árbitros, permitindo a definição de lances com a acurácia nunca antes vista, prevalecendo a verdade das imagens dos lances registrados de modo tridimensional, propiciando uma drástica redução de erros de julgamento, provenientes da interpretação humana do árbitro de campo, que sob um ponto de vista limitado, fazia prevalecer em absoluto a sua versão dos eventos do jogo, o que permitiu na Copa do Mundo FIFA de 1986 a validação de um gol de mão do atacante argentino Diego Maradona, decisivo contra a Inglaterra1 em evento que ficou conhecido como o gol “a mão de Deus”2 .

Chamo a atenção, no entanto, que o tempo de análise dos lances, considerando-se a instantaneidade das transmissões, tem causado situações e confusões inusitadas. Quem não se surpreendeu com a anulação do gol do jogador brasileiro Vinicius Júnior, na segunda partida do Brasil, contra a Suíça? Comemoramos prazerosamente com direito à estouro de fogos, gritos emocionados e abraços ao nosso tão característico e efusivo estilo. Mas não valeu! Graças a Deus e à Casemiro, vencemos!

O mais surpreendente, entretanto, tem sido as reviravoltas de resultados. As seleções da Argentina e da Alemanha, por exemplo, sentiram na pele a sensação de estarem inicialmente triunfando contra seleções inexpressivas, tendo, entretanto, ao final saído de campo aturdidas com suas derrotas, em viradas de resultado históricas.

Em meio a tais elucubrações lúdicas, permito-me ponderar, agora no âmbito jurídico tributário, que este sentimento de surpresa, apreensão e incerteza quanto aos resultados da Copa do Mundo do Catar encontra paralelo de similitude no contexto do desfecho jurisdicional do julgamento do ICMS-DIFAL incidente sobre as operações de aquisição de mercadorias destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.

Contextualizando a matéria, observa-se que, por meio do advento da EC n.º 87/2015, com as alterações nos incisos VII e VIII do §2º do art. 155 da Carta Cidadã, o legislador constitucional buscou encerrar ou ao menos amainar de forma sólida e perene a discussão envolvendo a conhecida disputa fiscal entre os estados, a guerra do ICMS, no que toca às operações envolvendo circulação interestadual de mercadorias e serviços.

Outrossim, adotando-se a boa técnica de hermenêutica constitucional, infere-se que a alteração constitucional se deu não no sentido de criar nova hipótese de incidência tributária, mas de disciplinar de forma suprema, os lindes da partição da receita tributária advinda da hipótese de incidência já prevista no inciso II do caput do art. 155 da Carta Constitucional, no que tange a circunstância fática de a operação de circulação se dar no âmbito de dois estados federados.

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 1.287.019, em sede de repercussão geral (Tema 10933), concluiu pela necessidade de Lei Complementar para que se proceda à cobrança do DIFAL, com o fito de regulamentar a cobrança do ICMS, nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.

Nesse sentido, ao modular os efeitos da decisão contida no aludido tema, a Corte Suprema decidiu pela aplicação dos seus efeitos a partir do exercício financeiro 2022, ressalvando-se a eficácia imediata da cessação da atuação fiscal para os titulares das ações já em curso no momento do julgado.

Observe-se, entretanto, em paralelo ao desenrolar final da celeuma judicial, entrou em vigor a Lei Complementar Federal n.º 190 de 4 de janeiro de 2022, regulamentadora da matéria em destaque, contudo, o seu art. 3º definiu que a sua eficácia se submete a regra de anterioridade nonagesimal, nos termos da CF88: Art. 3º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação, observado, quanto à produção de efeitos, o disposto na alínea "c" do inciso III do caput do art. 150 da Constituição Federal.

Por seu turno, o aludido dispositivo constitucional limitador estabelece a obrigatoriedade do transcurso do lapso de 90(noventa) dias da data da publicação da aludida norma, para que sejam destravados os seus efeitos normativos, diante do que se infere que a suspensão da exigibilidade do crédito deverá ser implementada durante tal interstício, consideradas tais circunstâncias legais e normativas.

Obtempere-se, ainda, que o aludido dispositivo da norma complementar federal é atualmente objeto de exame de constitucionalidade, por meio das ADI 7066/7070/7078, contudo, conquanto tenham sido requeridas, nas ADI 7070 e 7078, medidas cautelares, dirigidas a afastar a regra da anterioridade nonagesimal, para permitir o restabelecimento da retomada da cobrança geral do tributo em destaque, a partir da vigência da norma regulamentadora, tal pretensão liminar foi rejeitada 4, preservando-se, pois, a regra suspensiva da atuação tributante sob destaque.

Na prática, ressalvados os casos em que havia prévia judicialização, a norma tributante ICMS DIFAL, somente sofreu interrupção de eficácia por 90(noventa dias), portanto, nos três primeiros meses de 2002, retomando-se em plena eficácia desde então, afetando milhões de operações de consumo por e-commerce, interestaduais por excelência, cada vez mais crescentes e pujantes no nosso país.

Contudo, conquanto a relevância do tema e a dimensão econômica dos interesses envolvidos, apesar de já estarmos no final do ano, o julgamento ainda não se encerrou, tendo por último acontecimento o pedido de vista do Min. Gilmar Mendes, devolvido para julgamento em 29/11/2022 e incluído na lista de julgamento, agendado para julgamento virtual 09/12/2022 a 16/12/20225, ou seja, o resultado será definido aos quarenta cinco minutos do segundo tempo (dois dias antes da final da Copa do Mundo 2022), sendo que o placar do julgamento, que começou favorável ao reconhecimento da inconstitucionalidade do dispositivo que impôs a aplicação da regra limitadora do poder de cobrar o tributo em questão, sofreu reviravolta esta

ndo, até o momento de elaboração deste texto, formada a maioria em favor da cobrança do imposto não após noventa dias da publicação da Lei complementar, mas no exercício seguinte, o que no caso se dá a partir de janeiro de 2023.

Contudo, conforme já dito, o ano jurídico de 2022 já alcança a sua marca final e, considerando-se que a solução do julgamento ainda não ocorreu, muito menos houve a suspensão da eficácia da lei que estabeleceu suspensão por noventa dias, tem-se por provável a utilização da eficácia moduladora da decisão final, inclusive, por fundamentos mais políticos do que jurídicos propriamente.

Nós torcedores brasileiros, comerciantes, consumidores finais não contribuintes, destinatários finais dos produtos objeto de operações estaduais, cada vez mais incrementadas, sobretudo pelo e-commerce, o principal foco da tributação em destaque, tal qual na Copa do Mundo, experimentamos no caso, idênticas sensações de ansiedade, surpresa e apreensão, sonhando em comemorar o desfecho jurisdicional favorável em derredor do tema, contudo, na prática, o que nos assinala é o prenúncio decepcionante da sensação de comemorar um gol anulado, sobretudo diante da mencionada aplicação da modulação dos efeitos do julgado.

Sigamos, entretanto, perseverando, como todo brasileiro, acreditando que a mensagem que deve persistir para o ano de 2023 é a da esperança, de que sejamos tenazes, mesmo diante de reviravoltas e efetivas derrotas, pois até mesmo um deserto pode se transformar em um oásis (o Catar nos prova!). Confiemos e aguardemos o desfecho da Copa e o apito final do Supremo. Torçamos!


1 https://pt.wikipedia.org/wiki/Argentina_2%E2%80%931_Inglaterra_(Copa_do_Mundo_de_1986)

2https://pt.wikipedia.org/wiki/La_Mano_de_Dios

3 Tema 1093 - Tese:A cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais

4(STF ADI7078/CE, Decisão Monocrática, Relator: Min. Alexandre de Moraes, 17/05/2022, DJe 18/05/2022).

5 https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6330827

Sobre o Autor:

Imagem

Dr. Neilto Barreto Filho

Assessor de desembargador no TJBA, advogado licenciado, pós-graduado em Direito Tributário pelo IBET- Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, pós-graduando em Direito Digital, aplicadono Âmbito Judicial, pela ESMA-PB graduado em Direito pela UFBA.

  • Equipe Especializadas

    Quisque tellus risus, adipisci viverra bibendum urna.

  • Atendimento Eficiente

    Quisque tellus risus, adipisci viverra bibendum urna.

  • Comunicação Objetiva

    Quisque tellus risus, adipisci viverra bibendum urna.

  • Responsabilidade Social

    Quisque tellus risus, adipisci viverra bibendum urna.